Sempre fico a dever quando comento sobre o
comportamento de pessoas, especialmente dos formadores de opinião, por não
conhecer mais a fundo outros povos. Conheço superficialmente os brasileiros.
Por aqui, os denominados formadores de
opinião distorcem tudo em demasia. Pode ser na política, nos hábitos
cotidianos, na cobertura de catástrofes, no esporte. E se superam em elogios
quando se referem às estatísticas positivas dos gestores públicos.
Neste momento, interessa tentar rebater a
distorção sobre o apoio que os brasileiros teriam dado à realização de uma
Olimpíada, no momento em que o Brasil foi escolhido como país-sede.
Cabe ressaltar que, devido à magnitude do
evento, sua realização na América do Sul era, à época, inimaginável. Qualquer
pessoa, com o mínimo de bom senso se sentiria orgulhosa de ver seu país como
uma vitrine mundial positiva, mesmo que por alguns dias. Tal euforia,
inevitavelmente, pode ser equiparada àquela que se exibiu por ocasião da Copa
do Mundo aqui realizada.
Naquela ocasião, muitos
se entusiasmaram ante a possibilidade de realização do maior evento
desportivo do mundo em solo brasileiro e ante a visão de um possível
reconhecimento internacional, em cujo bojo viriam benfeitorias
concretas pelo “legado” deixado com a infraestrutura construída para os jogos,
pelos empregos gerados naturalmente, além de rendimentos financeiros deixados
pelos turistas. Num contexto de perspectivas como este, só seria contrário quem
fosse muito despeitado ou torcesse pelo “quanto pior, melhor”. Tudo isso,
obviamente, enquanto a Copa do Mundo ainda não se tornava realidade. Somente
depois dela, se refrearia o otimismo dos mais céticos.
Não ocorreu nenhuma mudança nas ações
governamentais após sua realização. Nenhum indicador social melhorou. O leque
diário de tragédias na Cidade Maravilhosa continuou como cartão de visitas
exibido ao mundo. Nesse período, uma criança teve sua massa encefálica
espalhada pelo asfalto, após ser arrastada presa a um carro; prenderam,
torturaram e sumiram com o pedreiro Amarildo; centenas de pessoas continuaram
sendo assassinadas pelas balas perdidas mais achadas do planeta. As “retomadas”
de territórios permitiram hastear muitas bandeiras ao som do Hino Nacional. Também
possibilitaram se disseminar a esperança com a instalação das Unidades de
Polícia Pacificadora, hoje totalmente desacreditadas e desmoralizadas.
Obras imponentes foram construídas para as
competições esportivas, as mordomias se mantiveram para o pessoal do andar de
cima, enquanto o Estado definhava para a inadimplência absoluta. No meio dessa
dicotomia entre obras nababescas e atraso no pagamento de salários, uma
ciclovia foi construída, inaugurada às pressas com as pompas de praxe e
entregue pronta para cair, ceifando mais duas vidas gratuitamente.
Agora é a vez dos Jogos Olímpicos. Na
estrutura física, parece que o Rio de Janeiro se equiparará às demais cidades
que já realizaram esses mesmos jogos. Somente nisso. Não houve nenhum projeto
no país inteiro com vista à preparação de atletas de alto rendimento, capazes
de competir em pé de igualdade com desportistas de primeira grandeza.
Chega-se a menos de um mês dos Jogos com o
Estado sem pagar os salários dos servidores, que, literalmente, estão passando
fome.
Se há aspectos positivos na realização desses
jogos é que, nos moldes em que foi preparada, a abertura poderá ser a mais bela
de todos os tempos, além de haver a possibilidade muito grande de uma
receptividade calorosa semelhante à abertura da Copa do Mundo de 2014.
Infelizmente, porém, o Brasil será o país-sede que menos ganhará medalhas de
ouro em toda a história dos Jogos Olímpicos. Após o grande evento, continuarão
os resgates de presos de presídios e de hospitais, as vidas sendo ceifadas gratuitamente,
as maravilhosas obras tornar-se-ão esqueletos pichados.
Definitivamente, voltamos ao tempo do
coronelismo, quando, quem preparava o banquete nem sequer tinha o direito de
usufruir dele.
O brasileiro que apoiou a realização dos
Jogos Olímpicos jamais poderia imaginar que seria à custa da fome literal do
seu povo e que consistiria apenas em uma festa para entregar medalhas aos
visitantes. Os cariocas têm razão: welcome to hell.
Pedro Cardoso da
Costa – Interlagos/SP
Bacharel em
direito
Pedro Cardoso da Costa é colaborador do blog Barradocordanews.com
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