Triunfo
de Flávio Dino, que completa um ano neste mês, foi também o êxito do
uso de novas formas de comunicação, que abriram brechas no domínio dos
coronéis da mídia local
Por Daniel Merli*
Revista Forum
Neste
outubro, completa-se um ano da vitória de Flávio Dino na disputa pelo
governo do Maranhão, encerrando 50 anos de domínio da família Sarney.
Vitória de ampla coalizão contra o atraso, liderada por um comunista,
fato inédito em eleições estaduais no país. Foi também o êxito do uso de
novas formas de comunicação, que abriram brechas no domínio dos
coronéis da mídia local.
O
Maranhão pode ser considerado um estado-síntese do chamado “coronelismo
eletrônico” – o controle de emissoras de TV por políticos,
retroalimentando seu poder local. No Maranhão, das quatro principais
TVs, três são controladas por políticos. A TV Mirante, retransmissora
local da TV Globo, é da própria família Sarney – gerando a situação
esdrúxula de, ao longo de quatro mandatos, a governadora Roseana
anunciar na emissora de sua própria família.
A
TV Difusora, retransmissora do SBT, é de propriedade da família Lobão,
do senador e ex-ministro Edison e do candidato derrotado por Flávio
Dino, Edinho. A TV Maranhense, retransmissora da Band, é de Manoel
Ribeiro, até o ano passado deputado estadual pelo PTB e líder do governo
Roseana na Assembleia. De cara, o quadro já colocou o candidato de
oposição para participar de três debates televisivos organizados por
empresas de seus adversários.
Nesse
quadro, a internet teve um papel essencial, mesmo no estado com os
menores índices de acesso à internet do país, de acordo com a Pesquisa
Brasileira de Mídia 2015, da Secom da Presidência da República. A
conexão baixíssima, em sua maior parte via celular, transformou
o WhatsApp no principal meio de comunicação. E criou canais de
comunicação da militância que se espalharam pela sociedade, permitindo a
criação de redes de apoio aos ataques da família Sarney.
As
empresas de comunicação logicamente também foram para a rede, onde há
predomínio de audiência da iMirante – braço digital do Sistema Mirante.
Mas a falta de legitimidade na cobertura – e principalmente na
não-cobertura – de alguns temas, abriu caminho para muitas iniciativas
autônomas. A transposição dos editores do jornal da família Sarney, O Estado do Maranhão,
para serem blogueiros oficiais do sarneysismo na rede, não deu conta da
concorrência de jornalistas independentes que atuam no estado.
Um
episódio marcante para a virada foi a crise do Presídio de Pedrinhas,
que ganhou repercussão nacional e mundial, mas como tantas outras, não
encontrava reverberação nos veículos locais. Acabou sendo difundida
localmente principalmente por blogs como o Marrapá, o que potencializou a
audiência dessa iniciativa do jornalista Leandro Miranda.
Para
a campanha de Flávio Dino, a internet teve papel essencial na
contestação de ataques ao candidato por veículos das famílias que
controlavam politicamente o Maranhão.
Foi
o caso de um vídeo supostamente “vazado” na internet, que foi ao ar na
TV Difusora, do então candidato Edinho Lobão, e apareceu no jornal da
família Sarney. No vídeo, um presidiário em um suposto depoimento
atribuía a Flávio Dino a organização de um assalto em São Luís. O vídeo
foi “desconstruído” no mesmo dia e divulgado pelas redes. Em menos de 24
horas, o preso já havia sido identificado e admitiu que havia recebido
uma promessa de pagamento para encenar o vídeo. A vacina ajudou a
inocular o episódio, que teve efeito reverso para a candidatura
sarneyzista, terminando por descredibilizá-la.
Foi
a edição de vídeos que permitiu à campanha difundir porWhatsApp para a
rede de apoiadores as edições dos melhores momentos de Flávio Dino nos
debates organizados pelas emissoras de TV de seus adversários. E dar
visibilidade nacional aos abusos, como a famosa entrevista para a TV
Mirante, em que o candidato é perguntado apenas sobre o comunismo e não
sobre o estado.
No
domingo que marcou o fim de seu domínio de 50 anos no estado, José
Sarney usou a coluna na capa de seu jornal para criticar justamente a
internet. Atribuía a ela a difusão da informação de que o Maranhão
frequentava as piores posições em todos os índices de qualidade de vida,
para ele uma mentira. “Cada vez mais, com o avanço das comunicações em
tempo real, é mais fácil você ser enganado e não saber onde está a
verdade”. Questionava: “calculem se Pilatos tivesse naquele tempo
blogueiros, sites, Facebook, WhatsApp e essa parafernália toda”.
Hoje
no governo, Flávio Dino mantém a internet como seu principal canal de
diálogo com a população, por meio de seus perfis e do governo
no Facebook e Twitter – por onde anunciou os nomes do secretariado e as
principais medidas de governo. O governo também investiu em um canal
próprio de radiodifusão que é a Rádio Timbira, emissora pública que
havia sido sucateada durante as décadas de governos Sarney.
Mas
a iniciativa mais importante foi o lançamento, ainda no primeiro ano de
governo, de um Orçamento Participativo (OP) no Maranhão por meio de
consultas pela internet. O modelo de OP havia se consagrado nas gestões
municipais do PT nos anos 1990, marcando o “jeito petista de governar”, e
foi implantado em nível estadual pelo então governador do Rio Grande do
Sul Olívio Dutra. Teve menos destaque ou foi simplesmente deixado de
lado em outras gestões de esquerda. Que a retomada, facilitada pela
consulta eletrônica, seja a semente de mudança de modelos de gestão pelo
país.
*Daniel Merli, 38 anos, foi coordenador da campanha de Flávio Dino para redes sociais e internet
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