Cristiane Sampaio
Brasil de Fato
A esquerda não deve fazer das eleições
de 2018 “apenas um saudosismo”, nem voltar para propor mais do mesmo. Essa é a
avaliação do atual governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), que, em
entrevista ao Brasil de Fato, destaca o tipo de programa que, para ele, o país
precisaria adotar na próxima disputa presidencial.
“Não se pode continuar a fazer o mesmo
que fazíamos porque há novas questões”, afirma. Um destes assuntos é o da
justiça tributária. “Precisamos financiar os serviços públicos e, para isso,
precisamos de Justiça Tributária, no sentido de que os mais ricos, os
milionários, bilionários, os rentistas e o capital financeiro têm que pagar os
seus impostos com proporcionalidade em relação aos mais pobres”, pondera.
Dino tem sido apontado como uma das
grandes apostas do partido na conjuntura política pós-golpe e também como um
dos principais personagens da esquerda brasileira na atualidade. Confira os
principais trechos da entrevista, gravada em São Luís, capital maranhense.
Brasil de Fato - O senhor tem dito que
“o pessimismo é uma armadilha ideológica”. Isso nos remete ao debate sobre a
criminalização da política, por exemplo. Por que, na sua avaliação, a população
não pode cair nessa?
Flávio Dino - O Gramsci tem uma
formulação que eu repito quase como um mantra e diz assim: “Pessimismo na
teoria, otimismo na ação”. Ou seja, você tem que ter criticidade pra
identificar o que está errado, pra corrigir e procurar os processos de formação
de campos de forças que resolvam esses nós, essas questões agudas que impedem o
desenvolvimento do país, a justiça social. Agora, você só fará o ciclo completo
se você tiver otimismo na ação, porque senão você vai ficar preso exatamente
aos diagnósticos e não vai fazer a prognose adequada, a luta adequada. Eu digo
que [pessimismo] é uma armadilha ideológica, porque é a paralisia da sociedade
em relação aos problemas nacionais e, ao mesmo tempo, uma espécie de
diversionismo, porque você desvia a atenção do que está acontecendo. Há coisas
de uma anomalia escabrosa, como, por exemplo, a injustiça tributária no Brasil.
Coisas que nem o regime militar teve
coragem de fazer agora estão se naturalizando, como, por exemplo, o país perder
algo simbólico do próprio conceito de soberania que é o poder de estabelecer a
confiabilidade da nossa moeda, do papel-moeda, a segurança das relações
jurídicas, porque apenas países muito atrasados praticam esse tipo de
terceirização ou privatização, qualquer que seja o nome que se queira dar.
Então, quando olhamos tudo isso que está acontecendo, é que nós identificamos
que, com esse sentimento de que o Brasil não tem jeito, o povo brasileiro
realmente põe tudo a perder, ou, no sentido mais da luta política, de que “a
culpa é dos vermelhos”, “a culpa é da esquerda”, é algo que atende exatamente
aos interesses dessa minoria de privilegiados que não têm o menor respeito pelo
sofrimento do nosso povo, pelos desempregados, por aqueles que precisam do
trabalho, da geração de renda, de investimentos, que moram no Brasil.
Brasil de Fato - Olhando um pouco para
as eleições de 2018, o senhor tem dito que acredita na vitória de Lula e da
esquerda. Se a gente pensar nessa questão da criminalização da política, como a
esquerda poderia driblar isso para atingir esse horizonte de retornar à
Presidência da República?
Flávio Dino - Só é possível colocando um
programa correto para o debate da sociedade. Nós não podemos fazer da eleição
de 2018 um saudosismo apenas nem um itinerário de perdas ou de erros. Temos que
olhar pra eleição de 2018 com a bandeira da esperança nas mãos e com o programa
na outra mão. Nós precisamos responder à seguinte questão: pra onde levar o
país neste próximo ciclo, que não seja apenas "mais do mesmo"? Você
não pode dizer que vamos continuar a fazer o que fazíamos porque há novas
questões que se colocaram nesse processo.
Acho, por exemplo, que temos que pautar
hoje, com muita ênfase, a questão tributária, e com muita clareza dizer pro
povo o seguinte: “Quem precisa dos serviços públicos é o povo mais pobre e por
isso nós precisamos financiar esses serviços. Para financiar isso, precisamos
de justiça tributária, no sentido de que os mais ricos, os mais poderosos têm
que pagar seus impostos com proporcionalidade em relação aos mais pobres. Esse
é um debate que nós temos que colocar como infelizmente não colocamos.
Há novas questões, outras se tornaram
mais atuais, como a própria questão nacional, porque, quando nós olhamos a
abordagem da temática da energia, o que o Brasil está fazendo neste momento?
Destruindo a sua soberania energética. Isso se refere ao pré-sal e se refere
agora ao setor elétrico, que são ativos estratégicos de uma nação forte, de uma
nação capaz de se desenvolver e prover serviços pra população, e nós estamos
abrindo mão disso. Então, a questão nacional adquiriu uma nova centralidade,
que não é o nacionalismo xenófobo, preconceituoso, mas é a defesa dos
interesses nacionais em razão da questão social, da necessidade de financiar as
politicas públicas das quais o Brasil precisa, de modo que tenho insistido
neste tripé: nação-educação-produção. Acho que em torno desse tripé nós temos
que encontrar as respostas e conseguir comunicar isso à população, por isso eu
acredito no nosso êxito eleitoral, porque só nós podemos fazer isso.
Brasil de Fato - Isso seria, então, a
matéria-prima mais importante do programa eleitoral de 2018?
Flávio Dino - Creio que sim, e nós temos
o desafio consequente, que é transformar isso em mensagens e políticas capazes
de alavancar uma nova mobilização social. E por que eu digo que só nós podemos
fazer isso? Porque só nós acreditamos nisto, em direitos, acreditamos nos
serviços públicos. Essa fração da elite que aí está acredita na naturalização
da injustiça, na exclusão social, na concentração de riqueza nas mãos de uma
minoria. Tenta empurrar goela abaixo uma noção de que a mão invisível do
mercado vai salvar o país, como se isso tivesse acontecido em algum país do
planeta. Nem nos Estados Unidos…
Essa tragédia do desemprego, do
aniquilamento de políticas sociais, a destruição desse patrimônio que nós
construímos ao longo do tempo que é o Sistema Único de Saúde (SUS), a
destruição das universidades públicas…Temos que transformar isso em potência
política, em movimento. Acho que esse é o nosso desafio, de encontrar esses
temas corretos, que já estão identificados, em negação ao que está aí, mas,
pelo caminho da afirmação, precisamos despertar uma nova esperança na
população.
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