De novo, uma manobra do Senado Federal reitera a
cultura nacional de aplicar a lei conforme o interesse do momento. Em função
dessa maneira fugaz de fazer política, o julgamento do impeachment da
presidente Dilma Rousseff foi fragmentado, para lhe tirar o mandato, mas
preservar seus direitos políticos.
Reserve-se a interpretação da Constituição ao
Supremo Tribunal Federal, a quem compete dar a última palavra sobre a validade
da fragmentação do julgamento e punição.
No deferimento do pedido de separação do julgamento,
o presidente Ricardo Lewandowski considerou o que determinava o Regimento
Interno do Senado. Aliás, esses regimentos internos, meras normas instrutivas
de procedimentos internos, tornaram-se verdadeiras normas legais e têm trazido
enormes prejuízos e confusão nos julgamentos Brasil afora.
Ficou
subentendido que a Constituição Federal ficou em segundo plano. Ora, as Normas
Constitucionais penetram em qualquer ambiente. Costuma-se levar essa posição ao
extremo nas convenções gerais de condomínios, nas quais as decisões são
consideradas absolutas, sem obediência a nenhuma regra extramuros.
Além
disso, a referência jurisprudencial deste impeachment foi definida pelo STF
como sendo o do ex-presidente Fernando Collor de Mello. Caso o entendimento da
fragmentação seja mantido, a posição do STF também teria sido obedecida de
forma fracionada. Como ele mesmo disse, naquele julgamento nem o ato unilateral
da renúncia salvou seus direitos políticos.
Direitos
não são dados ou retirados ao bel-prazer de órgãos ou de pessoas. São definidos
previamente em normas legais. Fosse o contrário, não haveria necessidade de
“direito positivado”. No caso em questão, a Carta Magna define a perda de
mandato e a inabilitação para funções públicas por oito anos. Não se lê nenhuma
condicionante “e, se, caso” o Senado queira.
Se
não pretendiam tornar a presidenta inabilitada, que não lhe tivessem retirado o
mandato. Simples assim. Agora, parece que retornaram ao tempo do poder absoluto
dos reinados quando, se quisessem, inabilitava-se; se não quisessem,
permaneceria habilitada.
No
campo político, a incoerência é que os senadores apregoaram tanto a necessidade
de melhorar o “modus operandi” de fazer política, mas, em cinco minutos, 19
deles – guardem bem os nomes - votaram pela cassação do mandato e depois
adocicaram seu gesto com a manutenção dos direitos políticos.
No
julgamento dos embargos infringentes relativos a uma das decisões do “mensalão”
o STF tomou uma decisão para lá de polêmica. Espera-se não se repetir o
entendimento do presidente da sessão de julgamento de que a Constituição
Federal não entra onde a porta estiver fechada.
As
feridas desse coice na Carta Magna precisam ser curadas rapidamente, e com isso
se restabelecer a certeza de que as regras precisam ser respeitadas, mesmo
queimando o açúcar que alguns senadores pretendem armazenar para combater a
amargura que se avizinha sobre a própria pele.
Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
Bacharel em direito
Pedro Cardoso da Costa é colaborador do blog Barradocordanews.com
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