O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), agendou para
terça-feira (3), às 14h, a sessão do Congresso Nacional que deverá
analisar oito vetos presidenciais. Entre eles está o veto de número 52,
que derruba alterações feitas pelo Congresso Nacional na Lei de
Diretrizes Orçamentárias de 2020.
O veto tem mobilizado
parlamentares e o governo desde dezembro, quando foi anunciado. A
questão motivou uma troca de farpas pública entre o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). E levou à convocação de atos a favor do presidente Jair Bolsonaro em 15 de março.
O principal motivo da disputa é a gestão de R$ 30 bilhões no Orçamento deste ano.
O projeto, que teve trechos vetados por Bolsonaro, foi aprovado em
dezembro de 2019 e inclui entre as emendas impositivas – que
obrigatoriamente têm de ser pagas pelo governo – aquelas feitas pelo
relator e pelas comissões do Orçamento. Além disso, determina que o
governo empenhe (reserve para pagamento), em um prazo de 90 dias, o
valor referente a emendas parlamentares.
As emendas impositivas
reduziriam ainda mais a margem de recursos disponíveis para livre
utilização do governo – os chamados gastos discricionários. Limitado
pelo crescimento de despesas obrigatórias, que incluem os gastos com
pessoal e Previdência e os mínimos constitucionais (para investimentos
em saúde e educação), o governo tem espaço cada vez menor para
investimentos.
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Segundo cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), 94% do Orçamento Federal está engessado com gastos obrigatórios.
Na
justificativa do veto, o governo afirma que a imposição das emendas
parlamentares é "contrária ao interesse público" justamente por aumentar
o volume de despesas obrigatórias.
Gastos voltam à lista de despesas que não podem ser contingenciadas
Outro
trecho vetado pelo presidente inclui, entre as despesas que não podem
ser contingenciadas pelo governo federal, os gastos com ações de
pesquisa e inovações para agricultura; com o Fundo Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico; com a Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (Embrapa); com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz);
com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea); e com o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
À exceção dos gastos com pesquisa e inovação para agricultura, os demais itens já haviam sido incluídos pelos parlamentares na lista de despesas que não poderiam ser bloqueadas em 2020.
Bolsonaro, entretanto, vetou a previsão – poupando do contingenciamento
apenas projetos das Forças Armadas e despesas vinculadas à função de
Ciência, Tecnologia e Inovação.
Na justificativa para o novo veto,
o governo volta a argumentar que a inclusão dessas despesas na lista
dos gastos que não podem ser contingenciados eleva a rigidez do
orçamento, dificultando o cumprimento da meta fiscal e da regra de ouro.
Orçamento foi ficando cada vez mais impositivo
A
lei do Orçamento que previu os R$ 30 bilhões sob gestão do relator é a
consolidação de um processo que se iniciou no Congresso ainda na década
passada – e que teve entre os apoiadores o então deputado federal Jair
Bolsonaro.
Ao longo dos anos, os congressistas cobraram a
efetivação do pagamento das emendas parlamentares. A queixa dos
deputados e senadores era de que eles aprovavam a inclusão das emendas
no Orçamento, mas o Poder Executivo era soberano para determinar se
iria, ou não, desembolsar os recursos. Assim, muitas requisições
apresentadas pelos parlamentares acabavam sem resultados concretos.
Para
reverter o quadro, em 2015 o Congresso aprovou uma proposta de emenda à
Constituição (PEC) que determinou a obrigatoriedade do pagamento das
emendas individuais apresentadas pelos parlamentares.
No mesmo
ano, o então deputado Jair Bolsonaro deu uma entrevista à jornalista
Mariana Godoy em que elogiava a imposição das emendas. "Esse Congresso
melhorou muito em relação ao passado, em especial graças ao atual
presidente [da Câmara], Eduardo Cunha (...). O governo não chantageia
mais [o Congresso]", afirmou. As declarações foram resgatadas pelo colunista Lauro Jardim, do jornal "O Globo".
Rigidez orçamentária aumentou ainda mais em 2019
No
ano passado, o Parlamento aprovou outra PEC tornando o orçamento ainda
mais impositivo. O texto expandiu a mesma regra também para as emendas
protocoladas pelas bancadas estaduais.
A aprovação das PECs
transformou o panorama da efetividade das emendas. Dados
disponibilizados pelo portal Siga Brasil, do Senado, apontam que, a
partir de 2016, as emendas passaram, de fato, a ser desembolsadas pelo
governo.
Em 2018, foram R$ 11 bilhões autorizados e, em 2019, R$
13 bilhões. Com a inclusão das emendas do relator e de comissões,
conforme foi aprovado para a LDO de 2020, o montante em despesas
impositivas do Congresso chega a R$ 46 bilhões neste ano, dividido da
seguinte forma:
- Emendas de bancada: R$ 5,9 bilhões
- Emendas individuais: R$ 9,5 bilhões
- Emendas do relator-geral: R$ 30,1 bilhões
- Emendas de comissão: R$ 687 milhões
A
quantia fora do habitual tem sido citada por governistas como uma
justificativa para explicar por que Bolsonaro e seus aliados foram
favoráveis ao orçamento impositivo no passado, mas agora defendem o
veto.
"Uma coisa é você fortalecer o Orçamento, que no fundo é uma
peça de planejamento. É importante que o orçamento seja impositivo para
que investidores e a própria sociedade saibam exatamente onde cada
centavo dos nossos tributos vai ser empregado pelo Executivo na ponta.
Outra coisa é você tirar R$ 30 bilhões do Executivo e passar para o
Legislativo, que vai descentralizar esse recurso, sem seguir
necessariamente as políticas que foram aprovadas durante as eleições",
declarou o líder do governo na Câmara, Vitor Hugo (PSL-GO), em vídeo
divulgado nas redes sociais.
Embora agora o governo critique
congressistas por "tirarem" R$ 30 bilhões do Executivo, no que foi
classificado de "chantagem" pelo ministro Heleno, parlamentares
governistas não se opuseram à aprovação desse mesmo projeto no fim de
2019. A matéria foi aprovada em dezembro, em votação simbólica.
Na
ocasião, deputados afirmaram que as alterações no texto – que havia
sido enviado ao Congresso pelo próprio Executivo, e depois modificado
pelos parlamentares – haviam sido costuradas com a liderança do governo.
Expectativa para a votação desta terça
A
sessão do Congresso que decidirá sobre o veto havia sido agendada
anteriormente para o dia 12 de fevereiro, mas foi cancelada após a falta
de acordo entre os parlamentares e o Executivo.
O debate tem se
colocado à margem das habituais disputas entre governo e oposição. O
veto de Bolsonaro é defendido, por exemplo, pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP),
líder da oposição no Senado. E a derrubada é advogada por parlamentares
de diferentes partidos, em especial os de centro. O deputado Toninho
Wandscheer (PROS-PR) é favorável à rejeição do veto – e ele é um dos
vice-líderes do governo no Congresso.
Governista, o deputado Bibo
Nunes (PSL-RS), por outro lado, disse acreditar que o Congresso mantenha
o veto de Bolsonaro. "A tendência é manter. Não será fácil, mas
acredito que será essa a decisão", declarou. Nunes afirmou que o momento
exige que os parlamentares que apoiam o governo mostrem "100% de apoio"
e garantam a votação necessária a Bolsonaro.
Na apreciação do
projeto em dezembro, no entanto, o próprio Nunes orientou a bancada do
PSL a votar "sim" ao projeto de lei que engessou os R$ 30 bilhões.
Para
que o veto seja derrubado, é necessário que a maioria de deputados
federais e senadores, em votações separadas, optem pela rejeição. Se uma
única Casa optar pela manutenção do veto, a derrubada é descartada. A
obrigatoriedade é da negativa da maioria dos parlamentares, e não apenas
dos presentes na votação.
Gazeta do Povo
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