Por Rodrigo Viga Gaier, Ricardo Brito e Lisandra Paraguassu
RIO DE JANEIRO/BRASÍLIA, 23 Out (Reuters) - O ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) se entregou às autoridades neste domingo horas depois de resistir a tiros e granadas e ferir dois agentes da Polícia Federal que cumpriam ordem de prisão dada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.
Jefferson foi preso em Levy Gasparian (RJ), a duas horas do Rio, porque, segundo Moraes, violou diversas vezes as regras do benefício da prisão domiciliar que cumpria desde o começo do ano, entre elas a de se abster de fazer declarações públicas e usar as redes sociais.
Na sexta, o ex-parlamentar gravou um vídeo com ofensas graves contra a ministra do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Cármen Lúcia, provocando ampla reação de repúdio.
Ao se deparar com os agentes federais em sua casa neste domingo, Jefferson revidou. "Na ação, dois policiais foram feridos por estilhaços de granada arremessada pelo alvo e levados imediatamente ao pronto socorro. Após o atendimento médico, ambos foram liberados e passam bem", afirmou a Polícia Federal em nota.
Em um vídeo, o próprio Jefferson contou que atirou contra agentes, mas disse que seu objetivo não era feri-los. "Eu não atirei em ninguém para pegar, eu atirei no carro e perto deles", disse ele, que só se entregaria após horas de tensão.
Aliado do presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL), Jefferson cumpria prisão domiciliar desde o começo do ano, réu num inquérito que apura a organização de milícias digitais e atos antidemocráticos e implica diversos bolsonaristas.
A uma semana do acirrado segundo turno das eleições contra Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro procurou se distanciar do apoiador ao publicar no Twitter um repúdio às ofensas contra a ministra Cármen Lúcia e à resistência armada contra agentes da Polícia Federal, ainda que tenha voltado a criticar os inquéritos de que Jefferson é alvo, comandados por Moraes.
"Repudio as falas do sr. Roberto Jefferson contra a ministra Cármen Lúcia e sua ação armada contra agentes da PF, bem como a existência de inquéritos sem nenhum respaldo na Constituição e sem a atuação do MP", tuitou Bolsonaro.
"Determinei a ida do ministro da Justiça ao Rio de Janeiro para acompanhar o andamento deste lamentável episódio", acrescentou o presidente.
Depois da repercussão do ataque aos agentes, Bolsonaro, que costuma criticar duramente decisões de Moraes, divulgou vídeo nas redes sociais defendendo a prisão e dizendo que quem atira em policial tem que ter tratamento de bandido, e ainda procurou levar algum crédito pelo desfecho.
"Como determinei ao ministro da Justiça, Anderson Torres, Roberto Jefferson acaba de ser preso. O tratamento dispensado a quem atira em policial é o de bandido. Presto minha solidariedade aos policiais feridos no episódio", disse o presidente, que tem entre agentes de segurança uma de suas bases eleitorais.
Já à noite, Bolsonaro insistiu: "Não existe qualquer ligação minha com Roberto Jefferson", e citou que o presidente de honra do PTB havia entrado no Superior Tribunal Militar para acusar o mandatário de omissão por não haver acionado as Forças Armadas contra Alexandre de Moraes --a base do pedido um artigo da Constituição que, de acordo com a interpretação de alas bolsonaristas, permitiria ao presidente invocar os militares contra outros Poderes.
Já o ex-presidente Lula procurou relacionar o comportamento de Jefferson com o que chamou de clima criado no país pelo presidente, além de criticar duramente as ofensas do ex-deputado à ministra do Supremo.
"A gente nunca viu uma aberração dessa, uma ofensa dessa, uma cretinice dessa, que esse cidadão (Bolsonaro) que é meu adversário estabeleceu no país", acrescentou.
MANDADO DE PRISÃO
No mandado de prisão contra Jefferson, Alexandre de Moraes lembra que o caso contra o ex-parlamentar se originou de denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) e que, quando da transformação do regime fechado em prisão domiciliar, no começo do ano, foram determinadas medidas cautelares, entre as quais o uso de tornozeleira eletrônica e a proibição de comunicação exterior, inclusive via redes sociais, entre outros pontos.
"Em diversas ocasiões, foram trazidas aos autos notícias de descumprimento das medidas cautelares impostas", diz Moraes em sua decisão.
Segundo o ministro do Supremo, a defesa de Jefferson "não apresentou qualquer justificativa" para as violações das medidas cautelares. Entre as infrações, Moraes cita vídeo com ofensas graves contra Cármen Lúcia, postado na sexta-feira.
Jefferson atacou Cármen Lúcia depois que a magistrada, no âmbito do TSE, votou a favor de punir o canal Jovem Pan por ter veiculado afirmações falsas ou distorcidas contra Lula.
"No caso em análise, está largamente demonstrada, diante das repetidas violações, a inadequação das medidas cautelares em cessar o periculum libertatis do denunciado, o que indica a necessidade de restabelecimento da prisão, não sendo vislumbradas, por ora, outras medidas aptas a cumprir sua função", diz o magistrado na decisão.
Moraes determinou ainda a busca e apreensão de "documentos/bens, bem como de todos os celulares, computadores, tablets e quaisquer outros dispositivos eletrônicos, em todos os endereços residenciais e profissionais" do ex-deputado.
Depois da resistência armada de Jefferson, Moraes emitiu um novo despacho, destacando a agressão aos agentes da PF como possível duplo crime de homicídio e determinou que a prisão deveria se dar ou pela decisão anterior ou na forma de flagrante delito.
Em uma indireta ao ministro da Justiça, Moraes destacou ainda: "A intervenção de qualquer autoridade em sentido contrário, para retardar ou deixar de praticar, indevidamente o ato, será considerada delito de prevaricação (art. 319 do código de Processo Penal)".
O caso de Jefferson acrescenta tensão em uma campanha marcada por episódios de violência entre apoiadores de Bolsonaro e Lula e pelo embate entre o atual presidente e autoridades da Justiça, que também comandam o tribunal eleitoral.
Bolsonaro vem fazendo reiteradas alegações falsas contra o sistema de votação, que ele diz, sem provas, ser passível de fraude.
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