14 janeiro, 2011

Coluna do Luiz Carlos: Os impactos da pós-modernidade nas relações entre pais e filhos

Somos e “estamos” pós-modernos. A pós-modernidade é um fenômeno recente. Ela emergiu da insatisfação diante da modernidade. O prenúncio da pós-modernidade parece ter sido feito pelo filósofo alemão Nietzsche que propagou a supremacia de Zaratustra e enfatizava veemente o “fim das verdades velhas”e a “transmutação dos valores” em sua famosa obra Crepúsculo dos Ídolos.” Este fenômeno teve vários afluentes. Husserl intui as essências, Kierkegaard retoma a existência concreta, Karl Jaspers busca a existência inobjetiva, Gabriel Marcel delineia a intersubjetividade, Bloch alça o princípio-esperança. Os filósofos da Escola Crítica de Frankfurt provoca a razão instrumental por meio de Horkheimer e Theodor Adorno, e pelo pensamento de Jurgen Habermas a ação comunicacional. Mais recentemente, Richard Rorty reivindica uma nova “Arché” e Lyotard faz uma hermenêutica da moral “volatizada”. Na pós-modernidade, há inegáveis avanços e retrocessos retrocessos.

Num mundo que passa por tantas transformações e crises não é possível ficarmos indiferentes. No âmbito familiar,podemos observar que somos uma das primeiras gerações de pais comprometidos a não repetir com os filhos os erros de nossos progenitores. Com a determinação hercúlea de abolir(ou amenizar) os abusos de um passado não muito distante, somos pais mais dedicados,atenciosos,reflexivos e compreensivos, mas, por outro lado, os mais inseguros,diáfanos e inabordáveis das décadas mais recentes da história.Cronologicamente, o momento em que a pós-modernidade instaura a aceleração histórica em todas as sua nuances.

É imprescindível atentarmos também que estamos lidando com uma geração de crianças mais "espertas", "ousadas", "agressivas" e "poderosas" do que nunca. Fica óbvio que, em nossa tentativa desesperada de sermos os pais que queríamos ter, passamos perigosamente e facilmente de um extremo ao outro. Nesta perspectiva, paradoxalmente somos a última geração de filhos que obedeceram e ainda obedecem a seus pais e a primeira geração de pais que "obedecem" a seus filhos. É hora de despertarmos para atalharmos os surtos tanatológicos que ensangüentam essas relações.

Podemos também constatar de forma pragmática que somos os últimos que tivemos medo, respeito, obediência dos pais e os primeiros que tememos os filhos. Os últimos que cresceram sob o mando dos pais e os primeiros que vivem sob o jugo dos filhos. E o que é mais grave, para não dizer assustador, os últimos que respeitamos nossos pais e os primeiros a aceitarmos (às vezes sem escolha...) que nossos filhos nos faltem com o respeito. Sem escolha significa também discordância, antagonismo, discriminação e às vezes se traduz em agressividade, hostilidade, sectarismo e sadismo.

Na mesma proporção e intensidade em que o permissível substituiu o autoritarismo, os termos das relações familiares mudaram de forma radical, para o bem e para o mal. Com efeito, antes se consideravam bons pais aqueles cujos filhos se comportavam bem, obedeciam a suas ordens e os tratavam com o devido respeito. Bons filhos eram as crianças que se portavam de maneira formal e veneravam incondicionalmente seus pais.

Em tempos de pós-modernidade e do “é proibido proibir”, necessariamente as fronteiras hierárquicas entre nós e nossos filhos foram-se diluindo. Neste sentido, mais um paradoxo, os bons pais, hoje, são aqueles que “conseguem” que seus filhos os amem, ainda que poucos os respeitem. Agora, são os filhos que esperam respeito de seus pais, pretendendo de tal maneira que respeitem as suas ideias, seus gostos, suas preferências e sua forma de agir e viver. Como se ainda não fosse suficiente, os patrocinem no que necessitem para tal fim.

Em síntese, os papéis se inverteram, e agora são os pais que devem agradar a seus filhos para ganhá-los e não o inverso, como no passado. Isto explica e justifica o esforço desmedido que fazem tantos pais e mães para ser os melhores e fiéis amigos e "dar tudo" sem nenhum parâmetro de limite a seus filhos. Afirmam categoricamente que os extremos se atraem.

Se o autoritarismo nefasto do passado encheu os filhos de medo(amedrontar é tiranizar) de seus pais, as inúmeras incertezas e angústias do presente os preenche de espanto e frustração, ao nos perceber tão frágeis e dispersos como eles, no momento em que estamos sofrendo perigosa regressão a respeito do verdadeiro valor da família em tempos de pós-modernidade.

Professor Luiz Carlos R. da Silva. Filósofo e historiador. Pós-graduando em Filosofia Clínica e Mestre em Educação.

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